Todo mundo é inocente até que se prove o contrário. No entanto, a pesquisa apresentada pelo Centro de Estudo de Segurança e Cidadania (CESeC) da Universidade Cândido Mendes, prova o oposto: cerca de 40% das prisões provisórias são abusivas. A informação foi divulgada em audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos, na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), nesta manha (13/03). Segundo o pesquisador da Cândido Mendes Ignácio Cano, muitas pessoas são presas injustamente. “Infelizmente, na dúvida, o sistema opta pela prisão provisória, o que não é favorável ao réu. Esse abuso da prisão acontece, sobretudo com pessoas de origem humilde e de cor negra e, na maioria das vezes acusadas de tráfico de drogas”, explica o pesquisador.
Para o presidente da Comissão, deputado Marcelo Freixo (PSol), essa é uma das pesquisas mais relevantes a que o colegiado teve acesso. “Ela mostra que o Poder Judiciário, com participação do Ministério Público e da própria Polícia Civil, prioriza as prisões, em substituição das investigações. Isso provoca um inchaço do sistema penitenciário e uma quantidade enorme de casos de injustiças”, ressalta o parlamentar, que encaminhará um relatório sobre o que foi discutido para a presidente do Tribunal de Justiça do estado do Rio (TJ-RJ), para o Ministério Público e para o chefe da Polícia Civil.
Há um mês, o estado acompanhou a história do psicólogo e figurante de novelas Vinícius Romão, de 27 anos, que ficou preso injustamente por 16 dias, após ser acusado de ter roubado a bolsa de uma copeira. Presente ao encontro, Vinicius contou que estava andando com um fone de ouvido quando foi abordado por um policial. “Eles me acusaram de ladrão e já foram me levando para a delegacia. Eu não tive direito a nada, sequer fui ouvido. Tentei informar que aquilo era um erro, mas ninguém me deu atenção. Os meus direitos não foram vistos e por uma identificação equivocada fui preso. Eu não estava vestido com as roupas descritas pela mulher e nem fui encontrado com nenhuma bolsa. Só pelo fato de ser negro e ter um cabelo Black Power fui identificado como criminoso”, desabafou. O delegado da 25ª DP, no Engenho Novo, Zona Norte da capital, Niandro Ferreira, disse que todos os erros estão sendo apurados pela Corregedoria da polícia.
Este não foi o único caso relatado durante a audiência. Douglas de Oliveira, de 20 anos, viveu uma história muito parecida com a de Vinícius. Ele foi abordado por policias em casa, às 5h da manhã, com um mandado de prisão. “Os polícias já foram invadindo a minha casa e me chamando de bandido. Eles me levaram para a delegacia de cueca e descalço – da forma como acordei”, narrou Douglas, acusado de roubar um carro e reconhecido através de uma foto de Facebook. A vítima descreveu o assaltante como negro, magro e com a cabeça raspada. “Com essas características era possível prender a metade do Rio de Janeiro. Fui claramente alvo de racismo”, aponta Douglas, que ficou preso durante 27 dias e só conseguiu ser solto quando provou que, na hora do assalto, estava de plantão na clínica de saúde onde trabalha.
Para o defensor público Felipe Almeida, o sistema de justiça criminal do Brasil é discriminatório. “A gente inverte toda a sistemática processual penal de que o acusado é que tem que provar que é inocente, ou invés de ser o Estado a provar que ele realizou aquele crime. Existe uma presunção de veracidade quando nós temos um réu negro e pobre e isso dificulta muito o trabalho da defesa”, explica Felipe. A defensoria ainda aconselhou que nesses casos as vítimas procurassem a defensoria pública para que seja aberto um processo de indenização.
No dia 28 de março será realizada outra audiência pública sobre os presos provisórios na Alerj. Também estiveram presentes na audiência o deputado Paulo Ramos (Psol) e os defensores Leonardo Meriguetti, Alexandre Inglês e Francisco Horta.
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